“O pensamento de Freud é o mais perpetuamente aberto à revisão. É um erro reduzi-lo a palavras gastas. Nele, cada noção possui vida própria.”
Jacques Lacan, Abertura do Seminário Livro 1, p.10.
Há algum tempo ouvi alguém dizer “adoro Psicanálise, mas tenho horror a Freud”, confesso que parei por um momento como se tivesse tido um bug, pensei “como assim?”, de fato a frase e o pensamento não faziam sentido algum para mim, afinal, querer descolar a Psicanálise de Freud é da ordem do impossível, pois toda a sua produção passou por uma investigação profunda do seu próprio inconsciente. Se é possível a alguém uma autoanálise, certamente este alguém era Freud. A Psicanálise saiu de suas entranhas, é isto que o fez ser o seu Pai, Sigmund pariu sua teoria de modo intenso e doloroso, com muito trabalho, lágrimas, suor e sangue. Ele sublimou tudo que havia de conteúdo em si para construir aquilo que viria a ser uma ferida no narcisismo humano, um divisor de águas no modo como o sujeito viesse a olhar para si, não sendo mais o senhor de sua própria casa. A descoberta do inconsciente é de fato um mergulho n’Isso que somos, com todas as nuances, gostos e sabores, prazeres e desprazeres, de tal modo que mergulhar na Psicanálise, é mergulhar em seu criador, seus textos, cartas, escritos, experiências e tudo o mais, como bem disse Lacan, “Nele, cada noção possui vida própria”. Com o passar dos dias a frase continuou a reverberar em minha mente, e só consegui entender este horror como uma resistência, e se há resistência existe desejo. Isto já é suficiente, há ali um sujeito sendo convocado a desejar, a se haver, a se colocar diante de algo, e talvez esta fala possa vir a ser o início, ou não. Uma coisa é fato: “O pensamento de Freud é o mais perpetuamente aberto à revisão. É um erro reduzi-lo a palavras gastas. Nele, cada noção possui vida própria. É o que se chama precisamente a dialética. Algumas dessas noções foram, num dado momento, indispensáveis a Freud, porque respondiam a uma questão que ele havia formulado, antes, em outros termos. Só se aprende, pois, o valor delas, ressituando-as no seu contexto.” Jacques Lacan, Abertura do Seminário Livro 1, p.10.
Mariana Ramon - Associada AMP
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